sábado, 2 de abril de 2011

Cura religiosa incrementa a dinâmica social das comunidades rurais

De: Yuri Assis, por: Ascom-UFPE

Nas populações rurais do interior da Paraíba, a cura religiosa ajuda a fortalecer os laços sociais e tem repercussões que ultrapassam o mero tratamento do mal físico. Introduzindo o conceito de cura social, a tese “A cura pela fé: crenças, saberes, práticas e poderes no mundo rural do Nordeste brasileiro”, defendida por Maria da Conceição Cardoso van Oosterhout, analisa os tipos de cura e seus impactos dentro das comunidades. O Trabalho foi defendido em dezembro de 2010, no Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS) da UFPE.

Segundo a pesquisadora, as diversas práticas curativas têm efeitos inclusive sobre as relações sociais. Ao livrar um alcoólatra do vício, por exemplo, traz benefícios para sua família, ao mesmo tempo em que contribui para sua reinserção na sociedade. Além disto, a ação está perpassada por um viés holístico, isto é, pela integração entre corpo, mente e espírito. "Associam-se benzimentos com orientação alimentar, orações e até fitoterápicos", afirma a pesquisadora. “Todavia, se a pessoa não possuir fé, não será curada”, ressalta.

A tese distingue ainda três modalidades sanativas, todas dependentes da fé do paciente. No caso da cura devocional, cultuam-se santos ou almas santas a fim de obter as soluções desejadas. "Se curada, a pessoa cria laços e obrigações de reciprocidade com essas divindades", define a pesquisadora.

Quanto à cura proporcionada por benzedores ou curadores populares, estes agem como intermediadores do poder divino, e, dessa forma, adquirem status social no meio em que atuam. "Aqui, cria-se uma relação de companheirismo, de aconselhamento, de escutas psicológicas, de expressões que atuam no sentido de fortalecer não só os locais e os encontros, mas também a amizade e a legitimação daquela liderança religiosa", explica Conceição.

Por último, as irmãs curadoras procuram intervir no eixo corpo-mente-espírito, por meio de orações e fitoterápicos. "As irmãs católicas buscam cuidar da harmonização do corpo e da mente recorrendo a procedimentos específicos. Ao ministrar medicamentos para o físico, recomendam que os doentes pronunciem palavras de cura interior, como 'Jesus me ajude, Jesus me cure, Jesus muito obrigada'", relata.

INTEGRAÇÃO – Contudo, o conceito de cura social não se limita à restituição da saúde, seja mental, física ou espiritual. "Em alguns casos, ser atendido pela 'graça divina' passa pelo fato de aceitar a própria doença e aprender a conviver com ela, quando o caso não tem solução", pontua Conceição.

A doutora em Sociologia destaca também que a cura religiosa age no plano psíquico, interferindo no comportamento das pessoas envolvidas. "Houve um caso em que a pessoa, ligada à umbanda, oferecia serviços de ajuda, e, ao visitar as famílias, deixava objetos estranhos nas casas. Ao procurar a 'causa do problema', retirava os mesmos objetos, iniciando seu trabalho", conta. "Através das reuniões das irmãs curadoras, ela iniciou uma fase de arrependimento, confessou sua 'doença' e modificou seu comportamento e seu papel na comunidade, buscando outro meio de vida", completa.

Para a pesquisadora, a cura religiosa, analisada sob essa complexidade, dispõe às comunidades carentes de assistência uma forma de suplantar suas faltas. "Essa espécie de assistência torna-se fundamental não apenas numa comunidade rural isolada, mas também principalmente nas comunidades desassistidas por políticas públicas", conclui.

Mais informações
Maria da Conceição Cardoso
conceicao.oosterhout@uol.com.br

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